ÚLTIMAS

21 de fevereiro de 2020

Uma (nova) carta para Ralf

Ralf, durante entrevista para o Globo Esporte em seu apartamento em São Paulo (Foto: Marcelo Braga)
Fala, Ralf. Beleza?

Pois é, quem diria que eu voltaria a te escrever de novo tão cedo né? Minha primeira carta está recém completando um mês...

Mas você decidiu romper o silêncio, e falou pro Globo Esporte, aí na sua casa. Falou bastante. E aí eu resolvi falar também. E vou falar bastante.

Sabe Ralf, você tá certo numa coisa: nada apaga a história. A vida não é mais como no antigo Egito, que quando a gente queria banir alguém, era só quebrar as pedras onde escreveu sobre aquela pessoa e pronto, ninguém mais saberia que ela sequer existiu. Hoje, tá tudo registrado. Tudo o que fazemos, que pensamos, em algum lugar fica registrado, e por isso é fácil relembrar depois.

Até mesmo por isso, foi muito fácil relembrar que, quando escrevi a primeira carta pra ti, onde exaltei seus números nesses quase 10 anos de Timão, estava indignado pelo fato de você ter sido avisado de véspera da dispensa. Escrevi: "o Corinthians nunca foi bom em valorizar seus ídolos".

Mas hoje, lendo sua entrevista, eu descobri que não foi bem assim, né? Você já sabia que não fazia parte dos planos do clube. Seus empresários foram avisados em novembro. Mas como eles esperavam que você pudesse fazer o Tiago Nunes mudar de ideia durante os treinos, aparentemente não te avisaram.

Bom, Ralf, isso muda um pouco as coisas. Se seus empresários não te comunicam as coisas como elas acontecem, por que o clube é o culpado, e não seus empresários?

Você critica o clube em sua entrevista, dizendo que mesmo com o aviso do clube a eles em novembro, esperava uma ligação pessoal. Diz que "uma coisa é falar com o agente, mas o profissional sou eu".

Mas seu agente não foi o suficiente para negociar a renovação do contrato em 2015, com uma multa ridícula o suficiente para ser quebrada pelo primeiro clube chinês que aparecesse? Como de fato aconteceu, menos de um mês depois? Estou confuso.

Você reclama de falta de carinho e gratidão da diretoria, Ralf, mas a função de uma diretoria é ser carinhosa ou profissional? O que você esperava, ficar encostado em um banco de reservas durante a temporada, ou jogar uma vez por mês até o fim do contrato? É esse "respeito" que você esperava do Corinthians? E por que só o clube te deve gratidão, e não o contrário? Era obrigação do Corinthians te proporcionar tudo o que proporcionou nesses anos todos? Você seria o mesmo Ralf em outro lugar? Dúvidas, dúvidas...

Mas talvez o mais surpreendente da sua entrevista, Ralf, é eu perceber o quanto você fica à vontade pra definir o que é o Corinthians ou não. Com todo o respeito à sua carreira e aos seus números, você realmente se julga em posição de julgar que o estilo de jogo "certo" do Corinthians é só esse onde você atuou? Ou que a nova filosofia não tem raça ou vontade? O que te dá essa liberdade, meu caro?

O Corinthians é uma instituição mais que centenária, com um passado rico e vencedor, onde mil filosofias já foram as "certas". O Corinthians não é só aquele onde você construiu sua carreira, fama e riqueza. E ninguém tem o direito de dizer "o Corinthians não é assim". O Corinthians é como ele quiser. E independente de como ele quiser ser, ele será sempre maior que qualquer jogador, inclusive você.

Sua entrevista foi bastante surpreendente, Ralf. Reveladora em muitos pontos, e decepcionante em tantos outros. Nela, você literalmente encarnou o Pitbull que conhecemos, mas um ferido, acuado, e sem razão. Torço pra que, nos próximos meses, toda essa mágoa passe e você perceba que profissionalismo não conta apenas para um lado, mas para ambos. Se vale jogar em um rival, pois é questão de profissionalismo, então não há porque esperar ligação pessoal sobre dispensa se seu empresário foi avisado...

Sigo torcendo pra que tenha sucesso nesses próximos anos. E para que você passe a cobrar de seus empresários que eles lhe comuniquem toda informação que recebem. Pois se isso não ocorre, a culpa é só deles, e de mais ninguém.

Até qualquer dia desses. Tente não sangrar mais sua imagem de ídolo.

Escrito e revisado por Daniel Keppler

Siga o autor no Twitter: @daniel_keppler

Nenhum comentário:

Postar um comentário