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14 de janeiro de 2020

Especial 20 Anos do Mundial - Parte 3: o dia em que a Band virou Globo

Elenco corinthiano em festa após o título mundial
Jogadores do Corinthians comemoram vitória sobre o Vasco, nos pênaltis, em pleno Maracanã lotado (Foto: Reprodução)
Chegou o grande dia: 14 de janeiro de 2020. Uma data que seria apenas mais uma, das 366 que teremos na temporada, mas que carrega algo de muito especial nela: há exatos 20 anos, o Corinthians vencia um estrelado Vasco da Gama, diante de 73 mil torcedores no Maracanã e milhões assistindo pela TV em todo o mundo, para conquistar o primeiro Mundial de Clubes da FIFA!

Desde o início desse site, temos feitos matérias especiais para celebrar as duas décadas dessa grande conquista: no dia 6, publicamos um resumo sobre a história quase centenária por trás da criação do torneio; e no dia 7, fizemos um relato completo sobre o histórico 2x2 contra o Real Madrid (ESP) pela fase de grupos.

Nesse dia 14, teremos vários conteúdos aqui, incluindo alguns textos, mas decidimos começar falando sobre um fato histórico sobre a final: a audiência histórica atingida por sua transmissão na Rede Bandeirantes. Mas antes, vamos relembrar um pouco de como ela foi parar lá, e o motivo da Globo não ter transmitido o torneio.

Depois da novela, não


Era a primeira vez que a FIFA assumia a organização de um torneio com representantes de todas as confederações continentais, ao contrário do que ocorria com a Copa Toyota. Mesmo assim, essa - a Copa Toyota - sempre foi vista pela grande maioria da imprensa brasileira (e por parte da estrangeira) como um Mundial "de direito", ainda que não fosse "de fato", por não ter o aval da entidade mundial (algo que mudou em 2017).

Liderando essa espécie de "validação midiática" do status mundial da Copa Toyota, tínhamos a Globo. A emissora transmitia os jogos da competição disputada no Japão e ajudou a, com o tempo, incutir na mente do torcedor que o clube que a vencia era o melhor time do mundo.

Selo do Mundial de Clubes 2000
Logo oficial do torneio (Foto: Reprodução)
Até que, em 1997, a FIFA anunciou a criação do seu torneio, e em 1999 confirmou a sua primeira edição no Brasil. Nesse mesmo ano, ocorreu a comercialização dos direitos de transmissão da competição por parte da Traffic, e sim, eles foram disputados pela Globo. Mas havia um porém: a grade de programação.

As partidas principais do torneio foram programadas para as 21h15, e isso era duplamente ruim para a Globo, pois elas começariam durante o Jornal Nacional e terminariam durante a "novela das 21 horas", que a essa altura já se sabia qual seria: Terra Nostra, um romance épico de Benedito Ruy Barbosa com elenco estrelado, investimento milionário e até filmagens no exterior, cuja estreia ocorreu em 20 de setembro de 1999.

A solução proposta pela emissora foi: colocar os jogos para mais tarde, ao final da novela. Mas a Traffic recusou, deixando claro que era a emissora que se adaptava aos horários do torneio, e não o contrário. Com isso, a oportunidade caiu no colo da Rede Bandeirantes, que agarrou e se tornou a casa do Mundial de Clubes na TV brasileira.

Boicote "global" 

Luizão contra o Raja Casablanca (MAR)
A tentativa da Globo de boicotar o torneio falhou desde seu início (Foto: Alexandre Battibugli/Placar)

A partir daí, o que se viu foi o início de uma guerra velada da Globo contra o torneio, que sofreu um boicote pouco visto quando se trata de eventos esportivos.

A linha editorial adotada foi: fingir ao máximo que o torneio não existia, e se isso fosse impossível, citá-lo como um torneio pequeno, sem expressão. O rótulo "torneio de verão" veio desse tratamento, dado pela Globo. A ideia era que, diminuindo a sua importância, não haveria migração de audiência para a Bandeirantes. O esforço foi tanto que a emissora chegou a dedicar, em alguns jornais, mais de cinco minutos à Copa São Paulo e menos de 30 segundos ao Mundial.

No entanto, a estratégia se mostrou fracassada já na abertura: a Band, que tinha uma média de 3 pontos de audiência no horário dos jogos, multiplicou seu desempenho e chegou a ter 25 pontos de pico durante a estreia, contra o Raja Casablanca (MAR). No jogo seguinte, com o jogo contra o Real Madrid (ESP) sendo jogado às 18h45, a Band foi ainda melhor: 25,5 pontos de média (e 36 de pico) contra 24,5 da Globo. A diferença para o Jornal Nacional chegou a ser de 14 pontos! E no terceiro jogo, de volta às 21h15, outro resultado de quase empate: a Band fez 29 pontos de média, contra 31 da Globo durante a classificação corinthiana contra o Al-Nassr (ARA). O boicote foi um desastre.

Falha na reaproximação


No dia seguinte à classificação do Corinthians, a Globo enviou pela primeira vez uma equipe para cobrir o time durante o torneio, na volta aos treinos. E, nos bastidores, tentou negociar junto à Traffic a compra dos direitos da grande final, que seria dia 14. Mas ouviu um sonoro "não", tanto deles quanto da Bandeirantes, que não aceitava perder a exclusividade da transmissão.

“A Traffic chegou sim a receber um pedido da Globo para poder transmitir a final entre Corinthians e Vasco, mas já tínhamos vendido os patrocínios com exclusividade de transmissão e não foi possível repartir os direitos naquele momento”, disse Juca Silveira, hoje diretor de planejamento do Grupo Bandeirantes e à época responsável pelo acordo com a Traffic.

E chegando o dia 14 de janeiro, a expectativa era grande pelo que poderia acontecer. Vale lembrar que Terra Nostra, prestes a completar dois meses no ar, era um enorme sucesso de audiência. Na sua estreia teve 51 pontos de audiência e vinha mantendo índices próximos, mas estava sofrendo dificuldades por conta do Mundial. A final faria a novela perder?

CORINTHIANS X VASCO: O JOGO QUE FEZ HISTÓRIA


A decisão prometia ser histórica, e cumpriu a promessa com requintes de crueldade. O jogo começou às 20 horas já rendendo 27 pontos, empatado com a Rede Globo. Mas aos 10 minutos assumiu a liderança e não perdeu mais. Enquanto disputou com o Jornal Nacional, a diferença entre Bandeirantes e Rede Globo chegou a ser de 10 pontos, e diminuiu um pouco ao começar Terra Nostra.

Mesmo assim, a Band garantiu a ponta na média dos 90 minutos de tempo normal: 35 a 27 da Globo. O Globo Repórter, que começou durante a prorrogação do jogo, chegou a amargar apenas 12 pontos. E nos pênaltis, o recorde histórico: CINQUENTA E TRÊS (53) pontos de pico, superando os 50 pontos que uma luta do pugilista Maguila havia dado à Band em 1989! E a novela global amargou uma perda de 40% da audiência, chegando apenas aos 30 pontos.

Mudança de comportamento

O choque da derrota histórica na audiência daquele dia 14 de janeiro de 2000 fez a Globo mudar sua linha editorial: já no dia seguinte, a expressão "torneio de verão" foi banida de seus telejornais, dando lugar ao nome correto do torneio: Mundial. Foi assim que ela noticiou a chegada dos corinthianos a São Paulo após o título:



Após o adiamento e posterior cancelamento do Mundial 2001, e sua volta em 2005, a Globo mostrou que aprendeu a lição: passou a transmitir todas as edições e tratar a competição como prioridade para os clubes brasileiros. As equipes escaladas são sempre as melhores, tanto de reportagem quanto de narração e comentários, e o espaço dedicado nos telejornais é amplo, independente de qual brasileiro está na disputa.

Mas, naquele Mundial, há 20 anos, devemos dar o crédito a quem realmente eternizou nossa conquista: a Rede Bandeirantes e, especialmente, ao saudoso e eterno Luciano do Valle, cuja voz vai para sempre ficar marcada como aquela que consagrou essa conquista inédita para o Corinthians!

Escrito e revisado por Daniel Keppler

Siga o autor no twitter: @daniel_keppler

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