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12 de março de 2020

6 ações que poderiam mudar o Corinthians

Em busca de um norte, o Corinthians pode e precisa repensar alguns conceitos (Foto: Friedemann Vogel/Getty)

"O que será do amanhã, como vai ser o meu destino?"

A frase acima é um trecho de um samba de 1978, da União da Ilha. Mas serve, também, para ilustrar o pensamento de qualquer corinthiano desse planeta, nos tempos de hoje. Ainda mais quando esse se lembra que em novembro deste ano teremos eleições no clube. Ainda mais considerando que, ao que parece, será o mais disputado nos últimos anos.

Muito embora a eleição ocorra do lado de dentro dos muros do Parque São Jorge, onde um número restrito de eleitores, os sócios do clube social, são os portadores do destino de uma nação, do lado de fora do Parque São Jorge a popularidade do presidente Andres Sanchez nunca esteve tão baixa.
 
Óbvio, ele ainda tem seus simpatizantes, mas os mandos e desmandos durante toda jornada fizeram boa parte de sua base (não eleitoral) dentro da torcida corinthiana derreter.

Em razão de todos acontecimentos das últimas temporadas, onde o desejo de mudança começou a ser mais latente em boa parte dos corinthianos, trago a seguir alguns pontos que eu entendo como primordiais para uma retomada do Corinthians.

1) Reforma eleitoral

Talvez seja o grande objeto de desejo de quem entende que o Corinthians deve ser um tanto quanto mais democrático. Mas talvez deva ser, talvez, o tópico mais espinhoso de uma mudança estrutural.

Hoje, apesar de não ser o principal carro-chefe do Corinthians, o social, que detém a força do voto em suas mãos e, popularizar esse poder é matéria das mais difíceis. Não que seja impossível, mas é um dos mais difíceis. 

Boa parte das dores de cabeça diárias advém do clube social. Coisas que para nós, meros torcedores, são assuntos que deveriam ser tratados e acertados com um diretor específico da casa - afinal, o Corinthians hoje tem alguns problemas maiores do que: acessos a piscinas, marca do cloro e etc. Porém, longe de mim restringir os problemas do clube a essas banalidades citadas; só entendo que um presidente do Corinthians deveria ter como atividade exclusiva, gerir o maior clube do país em suas questões de maior impacto, delegando as questões menores.

E a solução, qual seria? Liberar os sócios do Fiel Torcedor para votar?

Pois bem, a solução deste tópico está ligada diretamente ao próximo item, a separação do futebol e do clube social. Mas uma outra saída, que pode ser implementada em paralelo a esta, seria possibilitar ao Fiel Torcedor ter o poder de voto, mas de forma que o programa não fosse usado como voto de cabresto para favorecer candidatos mais poderosos, digamos assim. E como fazer isso? Bem, impondo uma quantidade mínima de meses (ou anos) como sócio, por exemplo. Isso permitiria inclusive que o Corinthians desse um passo decisivo rumo à democratização do seu poder político, inclusive além das fronteiras de São Paulo - afinal, conhecemos a força do Timão em outros estados e regiões! Além disso, isso acarretaria em uma reformulação do Fiel Torcedor, talvez com a criação de um plano que visasse justamente estes torcedores, que mesmo distantes de São Paulo querem ter parte na vida do clube, gerando assim mais receita ao Corinthians.

Porém, injusto seria se nós, torcedores que entendemos a necessidade de uma “abertura política” do Corinthians, acabássemos por votar e definir o futuro dos sócios do clube social. Então deixo a reflexão: não seria o caso de os sócios deste decidirem, em separado, a liderança responsável pela gestão do clube, de maneira dissociada do futebol?

Em tempo: considero inoportuna uma mudança eleitoral antes das eleições de novembro, sendo que tal medida deveria e/ou poderia ser tomada pelo próximo presidente eleito, ainda pelo quadro societário do clube.

Os benefícios dessas medidas seriam enormes. Especialmente pelo principal: o surgimento de quadros políticos no clube se multiplicaria. Fugiríamos daquela sensação existente hoje, de que a situação e a oposição do Corinthians se misturam, em um eterno “eu sou você amanhã” ou “eu fui você ontem”. Por vezes, na dança das cadeiras do Parque São Jorge, um apoiador passa a ser oposicionista e volta a ser apoiador, e nessa história raramente surgem novas caras, com novas ideias e cheios de oxigênio para o Corinthians.

Já diria o escritor: “não há democracia sem participação social”. E num universo onde se tem 33 milhões de torcedores, deixar que 0,02% decidam o destino do maior time de futebol do país, é para mim, algo impensável em pleno século XXI.

2) Separação do clube social e do futebol

Se os interesses são distintos, porque manter os destinos entrelaçados? Urge a separação das contas do futebol e do social.

Porém, como é de conhecimento de todos, o gasto do social vai além do clube, passando também por esportes amadores do Corinthians. Por mais que doa falar, em uma contenção de gastos e um plano de recuperação financeira do Corinthians, esta deveria abranger também o social.

Tornar este o mais eficiente o possível, parando de tirar valores do futebol para cobrir não pagamentos do social, uma vez que, como podemos ler corriqueiramente, o próprio futebol não está se sustentando no aspecto econômico.

Eis que a grande questão surge: e as modalidades que dependem dos valores repassados pelo futebol ao social? Dentre todas elas, algumas com grande apelo competitivo, como a natação, o futsal e o basquete. São categorias repletas de histórias vencedoras, mas que fatalmente seriam bruscamente afetadas.

Duas seriam as possibilidades: uma redução de custos, que infelizmente diminuiria também a competitividade das equipes (ou que acabaria forçando os responsáveis pela categoria a serem criativos, como no futsal, quando vencemos a LNF repleta de garotos e com Bié de técnico, após diversas apostas em medalhões); ou então, caso realmente necessário, a paralisação temporária das categorias. O remédio, como dito, é amargo, mas é necessário.

E por mais que me doa, por gostar demais dos esportes que o Corinthians participa além do futebol, é a hora de pensar com a razão. Dentro do orçamento, boa parte do valor arrecadado deve e tem que ser gasto com o futebol, porém, não há vida (competitiva), infelizmente, em diversos esportes sem que haja o aporte advindo do futebol. Então trata-se de uma questão de escolha: ou enfraquecemos o investimento no futebol e mantemos algumas situações ou aceitamos a nova realidade de contenção com as categorias sustentáveis e/ou com a limitação orçamentária.

Mas o que adianta cortar na carne o lazer do torcedor que gosta de outros esportes além do futebol, se o social continuar corriqueiramente dando prejuízos? A resposta é clara: nada. Em razão disso penso que mais do que nunca o Corinthians precisaria determinar um valor fixo de repasse ao social, a partir do qual o mesmo deveria adaptar sua realidade, e forçando-o a encontrar maneiras de rentabilizar o clube - sem que isso signifique qualquer perda de patrimônio, claro.

3) Profissionalização do quadro diretivo

Imagina você trabalhar por amor a camisa, e só. Todo mês você ter gastos bem como entregar boa parte do seu dia, da sua semana, do seu fim de semana, deixando por vezes a família de lado e seus negócios. Como conciliar tudo e entregar 100% ao Corinthians? Hoje, por vezes, o topo da pirâmide eleitoral corinthiana é formado por empresários e profissionais liberais que tentam conciliar as suas agendas à agenda do Corinthians. E os servidores estatutários do clube fazem isso “pro bono”, ou seja, 0800, sem receber qualquer trocado pelo serviço prestado. No papel, pelo menos, é assim.

Isso é um problema, pois se você não paga por um serviço, não tem tanta autoridade assim pra exigir o máximo de qualidade. E o Corinthians precisa cobrar eficiência de seus profissionais, sejam estatutários ou contratados (como hoje é o caso do ex-zagueiro Vilson). Em razão disso, entendo que uma das formas é pagar pelos seus dirigentes na mesma medida que estes se dediquem exclusivamente ao Corinthians.

Exemplos nesse sentido não faltam; no nosso arquirrival Palmeiras, Paulo Nobre fez algo parecido, e no Flamengo há o Landim, que traça o mesmo caminho, abrindo mão de seus negócios para se dedicar ao Flamengo. É algo que o Corinthians deveria fazer, pois precisamos e temos que querer sempre mais de quem trabalha pelo clube.

4) Ajuste financeiro e do orçamento

É de conhecimento de todos que a situação financeira do Corinthians não é das melhores. Rotineiramente o Corinthians é protagonista em notícias que, de um lado rendem gozações entre torcedores, e de outro causa danos à imagem do clube, em todos os aspectos.

Por isso, é mais do que necessária a exposição de um plano claro e objetivo de recuperação do clube. Enumeração de credores e um plano de pagamento dos mesmos. Obviamente que isso nos faria apertar o cinto e faria com parte da torcida falasse “o Corinthians não é banco, é um time de futebol”. Pois bem, concordo que não seja banco, mas se não recuperarmos um poderio de investimento, logo veremos clubes que hoje enxergamos como pequenos ou médios nos alcançando e ultrapassando no poderio financeiro. Muitos já sabem que o caminho é a total profissionalização + reestruturação financeira e administrativa: Fortaleza, Bahia, Grêmio, Athlético-PR, Flamengo, além do Red Bull que tem um aporte financeiro a ser desvendado ainda em nosso país. Não podemos nos dar ao luxo de continuar levando com a barriga. Basta uma olhada rápida no futebol carioca e podemos observar o que aconteceu com quem ainda não acordou para a necessidade de pisar no freio e reorganizar a casa.

A gastança desenfreada deve ser combatida. O Corinthians hoje conta com quase 100 atletas profissionais, além dos gastos com a base, futebol feminino (um dos exemplos de gestão, que em breve deve se tornar autossustentável), esportes amadores e o clube social. Sem deixar de citar o financiamento da Arena, as dívidas do PROFUT e todos títulos protestados que regularmente aparecem na imprensa e geram piadas. O saldo negativo é muito grande, grande demais para continuarmos com a megalomania. É a hora de dar um passo atrás para conseguir dar dois à frente amanhã.

É um remédio amargo, mas não há outra opção.

5) Transparência

Há 13 anos, quando o grupo situacional assumiu o clube, era de se elogiar as medidas tomadas, no aspecto da transparência - uma vez que o Corinthians vinha de 14 anos com mandos e desmandos e quase nenhum acesso à informação por parte da gestão Dualib. Assim, a Renovação e Transparência inovava com os balancetes publicados regularmente.

Porém, o conto de fadas foi se perdendo aos poucos, até não sabermos qual é realmente o buraco que nos metemos. Num paralelo, apesar de não entrar no mérito da forma e de como foi feita a gestão, no Flamengo de Bandeira de Mello, uma das principais ações realizadas lá no início da gestão foi realizar uma auditoria da dívida. Foi um norte para eles, fundamental. Algo similar poderia e deveria acontecer por aqui, afinal o torcedor corinthiano precisa e merece ter conhecimento da dívida do clube. Afinal de contas, hoje ele praticamente paga sozinho por uma dívida que o clube criou junto às autoridades para transformar o sonho de ter um estádio na construção de uma Arena de Copa do Mundo. Não esqueçamos: o primeiro orçamento do nosso estádio era de R$ 350 milhões, e ele custou de fato cerca de R$ 1,15 bilhão. De lá para cá, a diretoria fracassou na busca por valores para ajudar a quitar mais rapidamente essa conta, e enquanto isso quem banca essa obra é a bilheteria.

Talvez a ilusão de “o buraco não é tão grande” faça com que alguns torcedores ainda insistam em devaneios, numa busca onde o Corinthians não pode competir no mercado com determinados clubes. Um chá de realidade poderia ajudar. É hora de pararmos de ver sinceridade como pessimismo para vermos como ela é: transparência. Afinal, assim podemos nos preparar para os dias difíceis - que assim como os fáceis, um dia passam.

6) Recuperação da marca

Hoje a marca Corinthians, apesar de toda sua força e grandeza, não possuí acordos dignos de seu tamanho.

Bem ou mal, vendendo a alma ao diabo ou não, financeiramente o contrato com a Nike é bem rentável - sem entrar no mérito das renovações quase que anuais com antecipações e luvas envolvidas. Hoje, o valor pago por eles é o maior da camisa do Corinthians.

Por outro lado, quando falamos de patrocínio master, é tamanha a falta de transparência quanto aos moldes do acordo com o BMG que não sabemos se o negócio é mesmo muito bom, mas mal explicado, ou se de fato é um péssimo negócio, como parece. Sem falar no fato de nossa camisa estampar, hoje, NOVE marcas ao todo, para não arrecadar sequer R$ 55 milhões ao todo.

O Corinthians não pode arrecadar tão pouco com sua marca, diante da exposição e do retorno midiático que traz. Ok que devemos considerar o momento econômico do país e todos acontecimentos além da esfera onde o Corinthians pode dar o seu melhor, mas, ainda sim, ficamos com a percepção de que já fizemos melhor e por isso, podemos mais.

Por isso é tão importante "limpar" a marca Corinthians. Uma marca sem os respingos diários de notícias de má repercussão, conseguiríamos um melhor ambiente de negócios, especialmente se isso fosse vinculado a uma reorganização administrativo-financeira do clube. E assim, com o tempo, seria natural a melhoria dos valores negociados com as empresas, e até mesmo o nível das empresas passaria a melhorar - afinal, hoje em dia não podemos dizer que só há gigantes do mundo dos negócios na nossa camisa... muito pelo contrário. Isso precisa mudar.

Conclusão

Ao fim de tudo, os 6 pontos levantados podem parecer obviedades em alguns pontos, como a recuperação da marca, a transparência e o ajuste financeiro, ou sonhos de uma noite de verão, como a reforma estatutária eleitoral, a separação do clube social bem como a profissionalização da diretoria.  Entendo também o tamanho do vespeiro para as mudanças mais difíceis. Mas não podemos continuar nesse ciclo vicioso, onde o social, sustentado pelo futebol, decide o futuro do futebol, e milhões de torcedores, que ajudam a pagar direta e indiretamente as contas do Corinthians, ficam de mãos atadas esperando o próximo capítulo de 3 anos.

O Corinthians necessita de uma nova cara, de uma mudança. Após alguns períodos de figuras marcantes, como Alberto Dualib (93/07) e Andrés Sanchez (com a Renovação e Transparência 07/20), o Corinthians precisa ser marcante por si só. Inegáveis foram as conquistas durante o período da Renovação e Transparência, a reconstrução do clube e os troféus empilhados, mas em algum momento, dentro de tantas conquistas, o prumo foi perdido.

Também não vejo como solução, membros alternando entre ex-apoiadores e atuais opositores. Talvez uma medida paliativa não quebrar o ciclo contínuo da Renovação e Transparência, algo que, infelizmente, parece precisar ser quebrado. Por isso minha expectativa e esperança de que o próximo presidente a assumir tenha o culhão de abrir a caixa preta, ser transparente com o torcedor e abrir o clube a quem é de direito.

A dança da cadeira com os mesmos figurões precisa acabar, o quanto antes. E antes que o clube não possa mais se salvar, precisamos fazer algo para que o corinthiano, aquele que enchia os olhos para assistir seu time e enchia a boca para bradar sobre a Democracia Corinthiana, possa escolher seu representante. É pela nossa história. É pela nossa sobrevivência!


Agradecemos ao Kaue Silva, grande corinthiano, por ter confiado em nós para hospedar esse texto, com suas ideias sobre o futuro do Corinthians

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